Uma comédia de viagem

É difícil fazer uma viagem em que tudo saia perfeito. Sempre há um detalhezinho que incomoda, alguma coisa que poderia ter sido melhor, algum atraso, um erro no percurso, um voo atrasado ou cancelado, enfim, algum probleminha aqui outra acolá.

O que mais escutamos são relatos de coisas que não sairam como planejado. E isso não é, necessariamente, ruim. Muitas vezes, estes detalhes não chegam a incomodar e até podem se tornar os relatos que dão graça para as viagens.

Acredito que isso acaba sendo o tempero mais saboroso do processo. Afinal de contas, viajar é sair da rotina, do conforto de sua casa e do seu dia-a-dia. Quando viajamos, por mais planejamento que tenha sido feito, estamos expostos aos imprevistos, ao novo, ao diferente.

Por isso considero que esses detalhezinhos são ingredientes essenciais para uma boa viagem. São eles que dão graça à experiência e a tornam verdadeiramente boa.

Em nossa última viagem vivenciamos boas doses desses detalhes. Viajamos para um local que já estivemos outras vezes. Não perdemos o vôo, não chegamos atrasados, não houve problema com o hotel, mas não fizemos o que planejamos e foi uma experiência maravilhosa.

A viagem foi para o Rio de Janeiro, em virtude do show solo do Eddie Vedder, vocalista da banda Pearl Jam. Passagens reservadas com antecedência. Estadia garantida em hotel na Barra, localizado a apenas 4km do local do show. Tudo certinho, planejado e revisto. Porém, nos esquecemos de um detalhezinho: o transporte no Rio.

Nos deparamos com esse probleminha às vésperas da viagem. Pensamos na locação de um carro, mas não conseguimos. Então fomos para o táxi.

Na saída do aeroporto o primeiro imprevisto. Fila grande para conseguir um carro. Era dia das mães e boa parte dos motoristas resolveu não trabalhar para poder comemorar com a mamãe! Motivo justo!!! Imagina na copa?!

Mas, sem estresse, não demorou muito e apareceu um motorista comédia. Em menos de 10 minutos no carro já sabíamos que ele era casado. A esposa engravidou com apenas 14 anos. Foram morar com o pai dele. O sogro não conversa com ele até hoje por isso. Ela perdeu o neném, mas eles continuaram casados e hoje já têm uma filhinha de 4 anos. Ele trabalha desde muito novo. Sofreu um acidente de moto no início do ano, tem 6 pinos na perna, ficou afastado e há duas semanas voltou ao batente.

Imagina o que não descobrimos da vida dele no trajeto que durou 1h30, em meio ao trânsito confuso e aos inúmeros atalhos que pegou, nos deixando com o coração na mão em cada morro que subia para fugir do engarrafamento? Mas tudo tranquilo, ele nos disse que não iria nos sequestrar.

Ah! Não podemos nos esquecer que o carro quase ficou sem gasolina, tivemos que parar em posto para abastecer, e que ele recebia ligações a cada 5 minutos, com o toque do mais legítimo funk carioca. Tudo certo. No final, já havíamos nos tornado amigos e ele quase nos convidou para o churrasco na casa da sogra para comemorar o dia das mães.

Chegando no hotel demos uma pequena volta nas proximidades para nos ambientar, mas estava frio e vazio. Então voltamos para descansar e ficar inteiros para o show.

Às 19h30 já estávamos prontos e arrumados. Descemos para pedir um taxi, já preocupados como faríamos para voltar do show, tarde da noite. Então entramos no elevador e encontramos um casal. Os dois bem tatuados. Ela vestida de preto, colar, pulseira e cinto de caveiras. Marcelo encosta sem querer nos botões do elevador e as luzes se apagam. Foi o click para iniciarmos uma conversa e descobrir que eles também estavam indo para o show, eram fãs do PJ e, o melhor,  tinham alugado um carro.

Em poucos minutos já estávamos no carro, a caminho do show, como amigos íntimos. Trocamos figurinhas sobre nossas profissões, filhos, sobre a paixão dos casais pelo Pearl Jam e dos shows da banda que ambos já assistiram, 2 a 2 para cada, incluindo um internacional para os 4, Lima para a gente e Nova York para eles - senti uma leve pontada de inveja sadia, confesso. Não tenho interesse e, muito menos, afeição pelos EUA, mas ver um Show do PJ no pais deles deve ser legal. E sem contar que NY é campo neutro, capital do mundo.

Durante o show nos separamos. Telefones trocados e a promessa de nos encontrarmos ao final para voltarmos juntos. Considerando que estávamos a pé e sem esperança de conseguir táxi isso significava a salvação para nós.

Show começa. Eddie Vedder lindo e cantando divinamente. O local do show era legal, pequeno, a visibilidade era boa de qualquer lugar. Mas, meu momento tiete aflorou e não me dava por satisfeita por não estar vendo as rugas dele. Poxa, quando teria outra oportunidade de estar tão perto dele assim??? Calcei a minha cara, joguei meu orgulho fora e na primeira oportunidade que tive, quando começou a tocar uma música do PJ e a galera se levantou, eu corri e fui pra bem perto do palco. Apenas bati no braço do Marcelo e avisei onde estava indo para não nos perdemos, nem dei chance dele tentar me impedir. Na ânsia de ir rápido me esqueci de um detalhe importante nesse tempos de registro digital: o celular. Só me dei conta disso quando estava a apenas 3 cadeiras do palco. Voltar para pegar não era uma possibilidade. Então era relaxar e aproveitar.

A visão era quase perfeita até que uma menina inventou de subir na cadeira e os demais a acompanharam. Ah, não... Não podia acreditar que estava tão perto e tão longe - o meu tamanho não ajuda, né!?!

Acho que a minha cara de desapontamento era tão evidente que um homem me cutucou e ofereceu o lugar dele na cadeira. Fiz cara de dúvida e ele completou: "sobe que você vai ver". Ele pegou as coisas da namorada que estavam na cadeira e entregou para ela. "Sobe para você ver". Ele falou novamente!

Isso era real??? Ainda existem pessoas de bom coração no mundo???. Subi e fiquei bem pertinho dele. Juro que não consegui nem cantar a música. Apenas contemplei aquele momento. Sim ele é real, feito de carne e osso, bem branquinho, a voz linda, mega simpático e descontraído... E tudo isso estava em minha frente.

Não sou do estilo tiete. Não tenho idolatria por ninguém. Mas, "pelamordedeus", Eddie Vedder, aquele cara que eu adoro escutar desde a adolescência, estava em minha frente!!! Não dá para ficar alheia a isso!!!!

Enfim, show acaba. Ainda em êxtase, encontro o Marcelo e adivinha quem mais??? Roger e Juliana, donos da loja Túnel do Rock, nossos amigos-vizinhos do hotel.

Eles também curtiram muito o show e ficaram bem próximos do palco. Todos felizes.  Extasiados. Ainda sem acreditar naquele momento que vivemos. Ela um pouco triste pela jaqueta que esqueceu no teatro. Ele zoando "hastag sefudeu". Demos início à procura de um Mc Donalds para matar a fome. Direita, esquerda. Caminho errado. Pega retorno. Volta que ta errado de novo. Boas gargalhadas. 

Enfim, conseguimos um Drive thru e, depois de um papo cabeça entre Roger e o atendente, pegamos os sanduíches e fomos embora para o hotel dormir. Isso já era mais de 01h00 da madrugada e todos precisavam madrugar para estar no aeroporto no horário.

Foi um excelente acaso do destino conhecê-los!!! Eles são ótimos, divertidos, animados, boas companhias! Já combinamos de nos encontrar, seja no próximo show do PJ, ou em Curitiba para ver se o pôster do Eddie ficou bem na área de churrasqueira, não é mesmo meninos!?!?

Hoje pela manhã ainda nos vimos no saguão do hotel. Eles atrasados para o voo das 9h00, no Galeão, e nós em cima da hora para o voo das 10h00, no Santos Dumont - trânsito no Rio tá um caos com tantas obras para a Copa.

No caminho Marisa Monte no rádio. Praias no visual. Lembranças do show surreal e das boas gargalhadas com os novos amigos. Tudo tranquilo. Perfeito? Claro que não. Perfeição é chata, monótona, sem graça, inibe as possibilidades. Por falar nisso, agora só estou escrevendo esse texto porque o nosso voo está atrasado!

Comentários

M.Ramos disse…
Essa viagem foi demais! Valeu meu anjo!!!!!